quarta-feira, 3 de junho de 2015

Thomas Mann, Doutor Fausto

"Sim, eram inspiradoras horas, dias, semanas. A dose de oxigênio que propiciava a vida ao ar livre, bem como as sensações paisagísticas e históricas fascinavam os jovens e lhes elevavam o espírito à altura de pensamentos que tinham aquele caráter despreocupado, experiencial, inerente à vida de estudantes, embora não tivessem serventia alguma para suas prosaicas carreiras posteriores, quando 
eles levassem vidas de filisteus, apesar de seu nível intelectual. 
Frequentemente observei esses moços no decorrer de seus debates teológicos-filosóficos, ponderando que vários dentre eles um dia considerariam os tempos passados na "Winfried" o capítulo mais importante de sua vida. Observei-os e observei a Adrian, com o pressentimento por demais nítido de que ele não pensaria da mesma forma. Avistei, não sem alguma angústia, um abismo fatal entre essa
juventude cheia de altas aspirações e a existência dele, a diferença entre as curvas do porvir de pessoas de uma boa e até excelente média, cujo destino seria abandonarem em breve o dispersivo e tateante estado de estudante, para se encaminharem à rotina burguesa, e, do outro lado, um homem estigmatizado de um
signo invisível, fadado a jamais afastar-se da senda do espírito e da problematicidade, que prosseguiria trilhando, não se sabia até onde, e cujo olhar, cujo comportamento nunca abrandado por atitudes fraternais, cujas inibições em face do uso dos tratamentos de "tu" ou "vocês" ou "nós" faziam com que eu e provavelmente também os outros percebêssemos que também ele se dava conta de tal dissimilitude" 

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