(...) E à noite não jantavam no hotel, onde os focos elétricos, jorrando
luz no grande refeitório, transformavam-no em um imenso e maravilhoso
aquário, diante de cuja parede de vidro a população operária de Balbec,
os pescadores e também as famílias de pequeno-burgueses, invisíveis na
sombra, se comprimiam contra o vidro para olhar, lentamente embalada em
remoinhos de outro, a vida luxuosa daquela gente, tão extraordinária
para os pobres como a de peixes e moluscos estranhos (uma grande questão
social, saber se a parede de vidro protegerá sempre o festim dos
animais maravilhosos e se a gente obscura que olha avidamente de dentro
da noite não virá colhê-los em seu aquário e devorá-los). No entanto, em
meio àquela multidão suspensa e atônita no negror da noite, talvez
houvesse algum escritor ou estudioso ictiologia humana, que ao ver como
se fechavam as mandíbulas dos velhos monstros femininos para engolir
algum pedaço de alimento, talvez se entretivesse em classificar tais
monstros pelas suas raças, pelos caracteres inatos e também por esses
caracteres adquiridos, graças aos quais uma velha dama sérvia, cujo
apêndice bucal é o de um grande peixe marinho, come salada como uma La
Rochefoucauld, porque desde a infância vive na água doce do Faubourg
Saint-Germain.(...)
(À sombra das raparigas em flor)
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