Ele contemplava com uma simpatia confusa aquela fronte alta e calma, aqueles olhos verdes. Era bela, sem dúvida, mas de uma beleza que parecia sonegar-se ao olhar. Acostumado a rostos como o de Lola, cujo sentido se impunha de imediato, brutalmente, Mathieu tentara cem vezes reter em conjunto aqueles traços escorregadios, mas escapavam, o conjunto desfazia-se a cada instante e o rosto de Odette guardava seu decepcionante mistério burguês.
(...)
Mathieu sentou-se. Gostava de Odette, mas não sabia nunca o que dizer-lhe.
- Como vai Odette?
Pôs certo calor na voz para dissimular a vulgaridade da pergunta.
- Muito bem. Sabe aonde fui esta manhã? A Saint Germain, com o carro, para ver Françoise. Isso me encantou.
- E Jacques?
- Muito trabalho ultimamente, quase não o vejo mais. Porém sua saúde é extraordinária. Como sempre.
Mathieu sentiu bruscamente um profundo desprazer. "Ela pertence a Jacques", pensou. Contemplava com mal-estar o braço moreno e fino que saía de um vestido muito simples, apertado na cintura por um cordão vermelho, quase um vestido de mocinha. O braço, o vestido, o corpo por baixo do vestido, tudo pertencia a Jacques, como os móveis, a secretária de mogno, o sofá. Essa mulher discreta e pudica recendia a posse. Houve um silêncio e em seguida Mathieu voltou à voz quente e ligeiramente nasal que conservava para Odette.
- Muito lindo o seu vestido, observou.
- Oh! escute - disse Odette com um riso indignado- deixe esse vestido sossegado. Todas as vezes que você me vê fala de meus vestidos. Deixe isso e diga-me o que fez esta semana.
Mathieu riu. Sentia-se agora bem disposto.
- Pois é justamente a propósito desse vestido que quero falar.
- Meu Deus, que será?
- Estou pensandos e você não deveria usar brincos com ele.
- Brincos?
Odette olho-o de um modo singular.
- Acha vulgar?- indagou Mathieu.
- Não, absolutamente. Mas tornam o rosto indiscreto. - E acrescentou, sem transição, numa risada: - Você estaria por certo muito mais à vontade comigo se usasse brincos.
- Por quê? Não creio- dises Mathieu vagamente.
Estava surpreendido, pensava: "Realmente, não é nada tola". Mas a inteligência de Odette era como sua beleza. Tinha algo esquivo. Houve um silêncio. Mathieu não soube mais o que dizer. No entanto, não tinha vontade de sair.
Gozava de uma espécie de quietude. Odette disse gentilmente:
- Não devo retê-lo mais. Vá ver Jacques. Você parece preocupado.
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